
O Jornal da ANE, em seu número passado, estampou de Bernardo Guimarães a composição Estrofes, dedicada ao Dr. F. L. de Bittencourt Sampaio, por ocasião de sua ida a Ouro Preto, em 1875. Eis estância de abertura:
Eu te saúdo, ó cisne de outras margens,
Que o vôo teu abates
Por um momento nestas fundas vargens,
Ninho de ilustres vates,
Cujo canto até hoje inda suspira
Na viração, que pelos montes gira.
E outra, a terceira:
Estes vales te acolhem prazenteiros;
Saúdam-te estes montes,
Sacudindo os espessos nevoeiros
Das enrugadas fontes,
E se ufanam de ver dentro em seu seio
O cisne, que de estranhas terras veio
Alphonsus de Guimarães Filho organizou Poesias Completas de Bernardo Guimarães, obra que o INL editou em 1958 e aí o livro Flores de Outono, donde extratado o poema referido. O exaltante e o homenageado concluíram o curso da Faculdade de Direito de São Paulo, respectivamente, nos idos de 1852 e 1859.
Em Memórias para a História da Academia de São Paulo de Spencer Vampré (2° Ed. Brasília, INL, Conselho Federal de Cultura, 1977) repercutem-se as loas de Silvio Romero e João Ribeiro ao poeta Bittencourt Sampaio no Compêndio de História da Literatura Brasíleira (Rio: Liv. F. Alves, 1906) e há realçamento do Hino Acadêmico, letra sua e música de Carlos Gomes.
Dessa parceria também resultou a conhecida modinha Quem sabe?… Cristina Maristany marcou com êxito o seu tempo na música de câmara e gravou essa criação artística em 1941, registro ainda hoje reproduzido (Revivendo RVCD-149). De outra, com Elias Álvares Lobo, a musicalização dos versos de Bem-te-vi e A Despedida. Esse seu parceiro foi o autor da primeira ópera brasileira, levada à cena em 1860, A Noite de São João, com libreto de José de Alencar e sob a regência de Carlos Gomes.
Francisco Leite de Bittencourt Sampaio nasceu em 1843 na cidade de Laranjeiras, do Estado de Sergipe.
Em 2005 a Secretaria de Estado da Cultura, de Sergipe, sendo seu titular José Carlos Teixeira, reeditou História de Laranjeiras Católica, obra escrita por Filadelfo Jônatas de Oliveira, sacerdote que acolá exerceu o paroquiato de 1904 a 1935. Descreveu ele o raiar da cidade em que viera ao mundo, à margem esquerda do rio Continguiba:
Laranjeiras nasceu aos acordes da música e entre flores
Nesse perfumado ambiente nasceu esta Cidade, que tanto tem cultivado a música e as letras.
E o poeta também cantou a urbe continguibense:
Minha terra é pequena cidade.
………………..
Entre montes, num vale escondida,
Assemelha-se à rosa florida
Do deserto que além desabrochou;
……………….
Felisbelo Freire, um Vulto da Ilustração Brasileira é texto de Paulo Mercadante inserido emHistória de Sergipe (2ª Ed. Petrópolis, Vozes; Aracaju, Governo do Estado de Sergipe, 1977) do aludido historiógrafo. Mercadante acentua, depois de mencionar Tobias Barreto, Silvio Romero, Gumersindo Bessa e Fausto Cardoso, que o historiador seria outro vulto de Sergipe à inquietação do tempo; e sublinha:
Em Laranjeiras se instalara o quartel-general das forças republicanas. Com Baltasar de Araújo Góis e Josino Meneses já havia Felisbelo Freire constituído o núcleo de combate à escravidão e à monarquia.
A Professora Maria Tétis Nunes, ocupante da cadeira 39 da Academia Sergipana de Letras, lembra que o notável humanista João Ribeiro iniciou as atividades jornalísticas, escrevendo em O Laranjeirense, órgão divulgador das ideias republicanas em Sergipe (João Ribeiro Intelectual de Múltiplos Facetamentos – Revista da ASL, n° 34).
Em certo momento a política atraiu Bittencourt Sampaio e então foi ele deputado geral, por sua província, em duas legislaturas pelo Partido Liberal e Presidente da do Espírito Santo. Em 1870 rompeu com os partidos monárquicos e assinou o Manifesto Republicano ao lado de Saldanha Marinho, Quintino Bocaiúva, Aristides Lobo, Salvador de Mendonça e outros repúblicos.
De 1860 é a coletânea de versos Flores Silvestres (Rio de Janeiro, Liv. Garnier) de Bittencourt Sampaio, em que se destacam, além daqueles musicados e já referidos, os poemas Hino ao Sol, A Cativa e A Mucama. Contém ainda, traduzidos: Excelsior! De Longfellow e O Prisioneiro, com a indicação de Béranger (creio tratar-se de Peirre-Jean Béranger, cançonetista e poeta francês).
Silvio Romero já dissera predominar nesse autor
o lirismo local, tradicionalista, campestre, popular. Por este lado é talvez o melhor poeta do Brasil… Os dotes principais da poesia neste autor são a melodia do verso, a graciosidade que faz primar em pequenos quadros, certa nostalgia pelas cenas, pela vida simples, fácil, descuidosa das regiões da roça e do sertão… (Evolução do Lirismo Brasileiro – Recife: J.B. Edelbrock, 1905).
Antônio Joaquim de Macedo Soares organizou, em 1869, Lamartinianas – Poesia de Affonso de Lamartine traduzidas por poetas brasileiros (Rio de Janeiro: Dupon & Mendonça, Editor). Entre os vates tradutores, Machado de Assis, Castro Alves, Maciel Monteiro, Bittencourt Sampaio, esse com versões de quatro poesias do criador de Méditations poétiques: Tristeza, Canto de Amor, À Lilla eO Isolamento. Da traslação bittencourtiana de O Isolamento transponho para aqui dois quartetos, o primeiro e o final:
À sombra do orvalho, às vezes sobre o monte
Assento-me sozinho e triste, ao pôr do sol;
Percorre a vista errante o plaino do horizonte
Que vário se desdobra à luz desse arrebol.
……………………
Quando secas no outono as folhas caem sem vida,
Da tarde as roja o vento ao longe pelo val.
Eu sou bem semelhante a folha emurchecida:
Oh! Leva-me contigo, horrendo vendaval!…
Olavo Bilac e Guimarães Junior em Tratado de Versificação (São Paulo: 2ª Ed., Portal, 1910) observaram que Bittencourt Sampaio, Trajano Galvão, Gentil Homem, Bruno Seabra, Joaquim Serra e Juvenal Galeano foram poetas legitimamente nacionais, cultivando o gênero bucólico e campesino, e celebrando, com sentimento – e graça, o encanto original da vida sertaneja do norte do Brasil.
Do repertório bibliográfico de Bittencourt Sampaio anoto ainda o poema épico A Nau da Liberdade, de 1870, e a Divina Epopéia de São João Evangelista, em versos heróicos, de 1882.
Fontes de Alencar